Recentemente saiu em vários jornais o resultado de uma pesquisa que relacionava o uso das redes sociais à depressão. Por este motivo, eu decidi beber na fonte: eu li a pesquisa. Em primeiro lugar, devo dizer que tentarei ser o mais suave possível. Afinal de contas, a ciência não precisa ser tão complicada.

A verdade é que esta não é a primeira pesquisa que relaciona sofrimento psíquico com redes sociais. Inegavelmente o uso delas trazem prejuízos à nossa saúde. Este assunto já vem sendo estudado há tempos. Ainda que muitos não acompanhem o que os artigos acadêmicos vêm dizendo, não é difícil constatar este fato. Para que eu dê exemplos disso, antes eu quero falar do único (prometo!) termo técnico desse texto: FoMO.

FoMO: que palavra é essa?

FoMO é uma sigla para “Fear of missing out”. Esta expressão em português seria algo como “medo de ficar de fora”. A expressão foi criada em 2004 por Patrick J. McGinnis em um artigo na revista “The Harbus”, da Harvard Business School. (O artigo ainda pode ser encontrado aqui)

Vamos entender melhor o que significa esta expressão. Não é difícil hoje abrir alguns perfis de grandes artistas em uma rede social e encontrar fotos de viagens, de festas, de uma vida recheada de grandes acontecimentos. Para o seguidor, é como se a vida estivesse passando e ele fosse apenas espectador dela. FoMO fala do medo da vida passar sem ser, de fato, vivida.

Ao clicar em algumas das fotos de um artista famoso, não é difícil perceber comentários como “meu sonho é um dia conhecer determinado lugar”, ou “quero um dia estar nessa mesma condição”. Perceba que a postagem do artista denuncia aquilo que o seguidor não tem.

A rede social faz parte de nossas vidas

A pesquisa mostra que as redes sociais fazem parte de nossa vida. Por exemplo, 68% dos adultos nos EUA tinham conta no Facebook e 75% destas pessoas relatam usar esta rede social diariamente. De maneira idêntica, o artigo fala do uso do Instagram e também do Snapchat.

Dessa maneira, a adoção generalizada das redes sociais tem permitido estudos que relacionam a influência delas na saúde mental. O uso do Facebook e do Instagram estão direta e indiretamente relacionados com sintomas de depressão. Tem sido percebido que o maior uso do Facebook está associado com uma autoestima mais baixa, assim como uma maior solidão. Por outro lado, o maior uso do Instagram está relacionado com questões de autoimagem corporal. Há estudos que relacionam o uso das redes sociais até com ideação suicida.

Como você usa as redes sociais?

O nosso comportamento dentro das redes sociais diz muito sobre entrarmos ou não no conceito de FoMO. Existem momentos em que somos mais ativos, noutros somos mais passivos e só gastamos tempo vendo as novidades. Portanto, consideremos a forma e do tempo de uso destas ferramentas.

Comportamento ativo

Acredito que cada um de nós lembra de momentos em que de fato estávamos participando ativamente de uma conversa e de outros em que estávamos ali, mas de fato nem prestávamos atenção ao assunto. Nas redes sociais acontece algo muito parecido. Por exemplo, há momentos em que produzimos conteúdo, escrevemos novos posts, publicamos novas fotos, comentamos as postagens alheias. Enfim, há momentos em que utilizamos as redes sociais para realmente interagir.

Comportamento passivo

Em contrapartida, muitas vezes nós nos percebemos naquele comportamento de apenas passar o dedo na tela. Não publicamos nada, não escrevemos nada de novo. Apensas continuamos utilizando o aplicativo sempre em busca de algo interessante para “matar o tempo”. Em suma, nós nos tornamos apenas consumidores passivos.

E o tempo diz muito sobre o nosso comportamento nesse quesito. Uma das coisas mais curiosas é que quanto mais tempo utilizamos as redes sociais, mais trocamos um comportamento ativo e assumimos um comportamento passivo. Ou seja, deixamos de interagir com nossos contatos e nos tornamos apenas seguidores.

Em toda pesquisa precisamos de um método

Para este estudo foram recrutados um grupo de 143 estudantes de graduação da Universidade da Pensilvânia. Destes, 108 eram mulheres e 35 eram homens. Além disso, a pesquisa foi feita em momentos diferentes do semestre letivo. Assim, 72 estudantes participaram da pesquisa no começo do semestre e os outros 71 participaram no final do semestre. Todos utilizavam Facebook, Instagram e Snapchat e todos possuíam um iPhone.

Todos tiveram que responder a sete questionários sobre temas diversos (“suporte social”, “fear of missing out”, “solidão”, “ansiedade”, “depressão”, “autoestima” e “autonomia e autoaceitação”). Além disso, ocorreu controle de tempo de uso diário dos aplicativos e da bateria do celular por quatro semanas.

Parte dos estudantes permaneceram com uso normal do aparelho. Em contrapartida, outra parte teve que restringir o uso do celular a apenas 30 minutos por dia. Não apenas isso, o uso era de 10 minutos por plataforma (Facebook, Instagram e Snapchat) que totalizavam os 30 minutos.

E o que eles descobriram?

De fato foi constatado que limitar o uso das redes sociais a 10 minutos por plataforma por dia durante três semanas trouxe uma influência significativa no bem-estar. Desse modo, sintomas de depressão e de solidão diminuíram naquele grupo teve acesso restrito ao celular. Aqueles que já apresentavam depressão (não importa em que grau) demonstraram diminuição de sintomas depressivos. Um dos participantes disse:

“não comparar minha vida com a vida dos outros teve um impacto mais forte do que eu esperava, e eu me senti muito mais positivo em relação a mim mesmo nestas semanas.”

E em seguida completou:

“Eu percebi de modo geral que as redes sociais são menos importantes do que eu estimava e eu a valorizo menos agora que antes do estudo”.

Além disso muitos alunos comentaram que não percebiam o quanto tempo gastavam nas redes sociais. Eles disseram que passaram a ter mais consciência e controle do tempo gasto após o experimento.

O resultado do experimento sugere fortemente que limitar o uso das redes sociais tem um impacto direto e positivo no bem-estar ao longo do tempo, especialmente com relação à diminuição da solidão e da depressão. É irônico o fato de que as redes sociais tenham sido criadas para conectar as pessoas, no entanto, elas de fato contribuem para que as pessoas se sintam mais depressivas e solitárias.

(A pesquisa original pode ser encontrada clicando aqui.)

No More FOMO: Limiting Social Media Decreases Loneliness and Depression
Melissa G. Hunt, Rachel Marx, Courtney Lipson, Jordyn Young

E o que esse estudo nos revela?

Um dos pontos mais provocadores desta pesquisa é que ela coloca um desafio a cada um de nós: assumir um papel ativo no cuidado de nossa saúde. Assim sendo, este pensamento nos convida a tomar a ação para superar a depressão. Nesse sentido, eu já havia comentado um pouco disso em uma outra postagem em que falei do tratamento da depressão (clique aqui).

Finalmente, muitos tratam a depressão apenas com o uso de medicação. Apesar disso, o uso apenas a medicação é pouco para o tratamento. Não seria interessante assumir outros comportamentos como parte do tratamento? Será que não estamos apenas assistindo a vida dos outros correr no passar dos nossos dedos?